segunda-feira, 13 de maio de 2013

EPIDERME


Sou a noite que não nasce, o sol que escurece
Quando todos dançam, gargalho, quando dormem, me afogo
Sinto um vazio sincero de coisas banais
Meu sono estremece na lembrança do passado e na utopia do futuro
Meus lábios foram marcados por ardentes paixões
E cicatrizados na salmoura das águas
Fiz-me estúpida para não ser sincera
Depois me fiz chão.

Tenho um riso aflito, uma graça errada
Tem verões em branco no passado
Minhas linhas não têm histórias
Meus joelhos não doem
Sinto falta daquilo que não provei
Dos recomeços que não criei
Sinto inveja dos corajosos e dos idiotas
Fiz do meu silêncio uma forma de protesto
Vesti uma armadura espessa, áspera
Os demônios se criaram aqui dentro
E... lá fora... um mundo que desconheço.

sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

DISPERSO

Sou de lugar nenhum, meu nome é ninguém
Na tristeza pulo, na alegria desabo
Por que motivos ainda caminho
Minha gloria vem de tempos que não reconheço
Já se foi o último gole de vinho
Os ventos já levaram as últimas dádivas
Não sei por que ainda corro
Nem por que levanto, que ironia da vida...
Quando noite não durmo
Que sorte pesada essa minha
Alguém por certo não teve piedade
Desses riscados trôpegos que se fez meu destino.

quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

PERDIDO

Tudo se perde no veneno dos teus olhos
No vermelho da tua boca
Na frieza do abraço
Na distância do querer
Tudo se perde na angústia do desejo
Nas entrelinhas do acaso
No desmerecimento da devoção
Na decepção onde não cabe mais você
Eu me perco nas lembranças bem vividas
No gosto de um pouco mais de tudo que sobrou
Eu me perco na descrença de um sonho
Na limitação de uma ideia persistente
Eu me perco querendo fugir do teu fantasma
Querendo mentir que não me assombra
Perco-me quando penso, quando invento
Perco-me na tua ausência e me curo no calor de outros braços.

quinta-feira, 3 de janeiro de 2013

O TEMPO DO TEMPO


O tempo é minha respiração afoita
Sustentou-se inerte, comportado
Enquanto via-me crescer
Foi de uma paciência instrumental
Deitou-se ao meu lado como se ali não estivesse
Dançava a minha dança, girava minhas vontades
Iludiu o meu ver e meu fazer
Fez-se silêncio enquanto eu gritava
A calmaria antes presente deu lugar a fúria
O tempo enfim desperta dos braços de Morféu
Embriagado de um sono que o fez perder juízo
Na aurora de um dia qualquer se deparou ao desconhecido
Não sabia se para frente ou para traz, inevitavelmente perdido
Evitou tanto o momento que já não sabia qual era
Correu pro futuro com medo de se atrasar, não encontrou
Voltou ao passado com vontade de resgatar, não havia nada lá
O tempo era uma roda gigante vendo tudo distante, sem alcançar
Brincando de vai e vem meu tempo tornou-se inóspito
Guiado por um saber inepto de uma clausura sólida.

INFECUNDO


O X da questão está sempre em fazer escolhas erradas
O dilema da dúvida, da opressão, do não saber envolvente
É um fio sob a navalha, é um corte certeiro
Entre ser o que é e o que se quer
Preciso agora apenas daquele orvalho salgado
Escorrendo pelas maças volumosas de minha face
Percorrendo as longínquas marcas que meu desconhecer criou
Precisa arder cada fissura, queimar o sal sobre meus poros
Preciso sentir o deleite de ser estagnado nesse mundo movimento
De olhar pela janela o preto e branco que sobrou das cores que partiu
O X é a lembrança faminta de algo que não fiz, que passou
O X é a esperança de uma vida além do acaso, da urgência
Sinto-me estérea de sonhos e realizações possíveis
Busco abrigo nos delírios entorpecentes de um querer vazio. 

quarta-feira, 2 de janeiro de 2013

O AMOR MATA


O amor é a única fonte de vida que mata
Que corta, que se alimenta de migalhas
Que sobrevive de feridas abertas
Proliferando como vermes na sobra
O amor desidrata, da catarata
O amor descalcifica o herói mais valente
Quebra-te os dentes, corrói-te o vazio
Engasga-te a vontade...
O amor é uma droga competente
Excita-te, vicia-te e engole-te lentamente
O amor é meu corpo desintegrando
Voltando ao pó, à semente, à terra estéril.

sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

EPITÁFIO


Sou um ego ‘sem vergonha’ daquilo que não fiz
Um elo entre sonho e realidade
Sou alguma coisa passiva de desejos incandescentes
Um pensar largo de um fazer estreito
Embriago-me sem vinho, parto-me sem rumo
Ao golpe de um desafio me quebro em pedaços
Sou do mundo, desato laços
Na espera de um reino, de um castelo sem fissura
Na fagulha do que vejo, na entre morte do acaso.